FALHAS NO ORÇAMENTO DO ENSINO IMPEDEM 30%
DAS CIDADES DE RECEBER VERBAS
Cerca de um terço dos
municípios brasileiros está com a execução de suas políticas públicas
comprometida por estarem impedidos temporariamente de receber recursos
federais, via transferências ou convênios. Dados levantados a partir do Sistema
de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope) revelam que, até a
noite de sexta-feira (18), quase 1.800 cidades não declararam ao Ministério da
Educação (MEC) a situação dos gastos e investimentos em ensino referentes ao
ano de 2011.
Conforme manda a Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF), as secretarias municipais e estaduais de
Educação devem transmitir anualmente informações sobre as finanças educacionais
por meio do Siope, um sistema eletrônico de planejamento e monitoramento dos
gastos com educação gerido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE), órgão do MEC, e conectado diretamente com o Tesouro Nacional. Os
municípios tinham até 30 de abril para prestar contas, uma regra adotada para
verificar o cumprimento da vinculação constitucional de investimento municipal
em ensino de 25% das receitas líquidas. O não cumprimento do prazo implica
interrupção temporária do recebimento de recursos federais não só para
educação, mas para todas as áreas de uma prefeitura, o que compromete a execução
de programas e até pagamento de salários de servidores.
"Grande parte dos 1.512
prefeitos que estiveram em Brasília na quinta-feira para assinar convênio de
creches com a presidente Dilma apenas assinou um documento, eles não podem
concretizar a política. Se não estiverem em dia com o Siope, não poderão
receber os recursos", alerta Paulo Cesar Malheiro, coordenador do Siope. À
medida que vão enviando as declarações os municípios se tornam elegíveis
novamente a pleitear parcerias com o governo federal.
Malheiro conta que em anos
anteriores, quando a declaração não era vinculada à interrupção de
transferências de recursos, os atrasos na transmissão dos dados era mais comum.
"Associar o Siope com a Lei de Responsabilidade Fiscal mexeu no bolso dos
municípios, ainda assim só vamos receber 100% da prestação de contas mais para
o fim do ano, quando começam a cair na conta das prefeituras o dinheiro das
emendas parlamentares, pois deputados e senadores vão pressionar os municípios
a saírem da pendência."
O coordenador do Siope
explica que a maioria dos casos de atraso ocorre em municípios pobres,
principalmente nas regiões Norte e Nordeste, que contabilizam mais de 900
cidades que ainda não enviaram as declarações exigidas pelo Siope. As razões
são as mais diversas: problemas de infraestrutura, ausência de técnicos
capacitados e dúvidas metodológicas. No Pará apenas 44% dos municípios
prestaram contas. A maioria dos municípios no Sul do Estado, conta Malheiro,
faz a contabilidade da educação em Belém, uma das quatro capitais, junto com
Cuiabá, Natal e Macapá, que ainda devem satisfação ao FNDE.
A prefeitura de Belém
informou que desrespeitou o prazo do Siope porque surgiram dúvidas quanto ao
preenchimento do formulário de prestação de contas. A Secretaria Municipal de
Educação e o FNDE estão em contato, e a transmissão dos dados deve ser feita
nesta semana. Já Natal passou por uma pane de informática na Secretaria de
Educação. "Nossa sede é um prédio antigo. Mandamos reformar a parte de
cabeamento de internet e tivemos uma pane há três semanas e o problema ainda
não foi resolvido. Estamos usando lan houses e computadores emprestados de
secretarias vizinhas para não parar todos os outros processos", relata
José Walter Fonseca, secretário municipal de Educação de Natal. Ele garantiu
que a situação se normalizará nesta semana.
Na avaliação do cientista
político Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à
Educação, o problema ocorre porque geralmente não é o secretário municipal de
Educação quem responde pela gestão das contas públicas do setor. "Quem
manda é o prefeito ou o secretário de Fazenda e em muitas prefeituras o
contador que cuida do relacionamento com o Siope é contratado externamente. É
uma ameaça para o dia a dia de todas políticas públicas do município e um claro
sinal de que educação não é prioridade para a gestão." (VALOR ECONÔMICO,
21/05/12)
Disponível em:
PROFESSOR:
AINDA O PIOR SALÁRIO
Segundo
o IBGE, porém, a diferença para demais profissionais com nível superior caiu
O salário dos Professores da
Educação básica no Brasil registrou, na década passada, ganhos acima da média
dos demais profissionais com nível superior, fazendo encurtar a distância entre
esses dois grupos. Esse avanço, no entanto, foi insuficiente para mudar um
quadro que tem trágicas consequências para a qualidade do Ensino: o magistério
segue sendo a carreira universitária de pior remuneração no país.
Tabulações feitas pelo GLOBO
nos microdados do Censo do IBGE mostram que a renda média de um Professor do
Ensino fundamental equivalia, em 2000, a 49% do que ganhavam os demais
trabalhadores também com nível superior. Dez anos depois, esta relação aumentou
para 59%. Entre Professores do Ensino médio, a variação foi de 60% para 72%.
Apesar do avanço, o censo revela
que as carreiras que levam ao magistério seguem sendo as de pior desempenho.
Entre as áreas do Ensino superior com ao menos 50 mil formados na população, os
menores rendimentos foram verificados entre brasileiros que vieram de cursos
relacionados a ciências da Educação - principalmente Pedagogia e formação de
Professor para os anos iniciais da Educação básica.
Em seguida, entre as piores
remunerações, aparecem cursos da área de religião e, novamente, uma carreira de
magistério: formação de Professores com especialização em matérias específicas,
onde estão agrupadas licenciaturas em áreas de disciplinas do Ensino médio,
como Língua Portuguesa, Matemática, História e Biologia.
Achatamento provoca
prejuízos
Pagar melhor aos Professores
da Educação básica, no entanto, é uma política que, além de cara, tende a
trazer retorno apenas a longo prazo em termos de qualidade de Ensino. A
literatura acadêmica sobre o tema no Brasil e em outros países mostra que a
remuneração Docente não tem, ao contrário do que se pensou durante muitos anos,
relação imediata com a melhoria do aprendizado dos Alunos.
No entanto, o achatamento
salarial do magistério traz sérios prejuízos a longo prazo. Esta tese é
comprovada por um relatório feito pela consultoria McKinsey, em 2007, que teve
grande repercussão internacional ao destacar que uma característica dos países
de melhor desempenho educacional do mundo - Finlândia, Canadá, Coreia do Sul,
Japão e Singapura - era o alto poder de atração dos melhores Alunos para o
magistério.
- Não dá para imaginar que,
dobrando o salário do Professor, ele vai dobrar o aprendizado dos Alunos. O
problema é que os bons Alunos não querem ser Professores no Brasil. Para atrair
os melhores, é preciso ter salários mais atrativos - afirma Priscila Cruz,
diretora-executiva do Todos Pela Educação.O presidente da Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Franklin de Leão,
concorda com o diagnóstico da baixa atratividade da profissão. Ele afirma que a
carreira de Professor, salvo exceções, acaba atraindo quem não tem nota para
ingressar em outra faculdade. Para Roberto Leão, salário é fundamental, mas não
o suficiente para melhorar a qualidade do Ensino.
- Sem salário, não há a
menor possibilidade de qualidade. Agora, claro que é preciso mais do que isso:
carreira, formação e gestão.
Priscila Cruz também diz que
o salário é só parte da solução:
- É preciso melhorar
salários para que os Alunos aprendam mais. Mas o profissional também tem que
ser mais cobrado e responsabilizado por resultados. Não pode, por exemplo,
faltar e ficar tantos dias de licença, como é frequente.
Distrito Federal lidera
ranking do magistério
Professores de Brasília são
os que recebem melhores salários. Rio é o 4 no ensino médio e 9 no fundamental
Os Professores do Distrito
Federal recebem os maiores salários da categoria no Brasil, conforme o censo do
IBGE. Nem por isso deixaram de fazer greve este ano. Durante 52 dias, cruzaram
os braços para reivindicar isonomia com as demais carreiras de nível superior.
O sindicato diz que um profissional ganha, em média, R$ 5 mil por mês - o que
deixaria o magistério em 23º lugar, dentre 26 áreas do governo local.
No balanço feito pelo GLOBO
a partir do censo do IBGE, o DF ficou na primeira posição do ranking salarial
de Professores por estado, tanto no Ensino médio (R$ 4.367) quanto no Ensino
fundamental (R$ 3.412). O Rio de Janeiro foi o 4º no Ensino médio, com renda
mensal de R$ 2.778; e o 9º no Ensino fundamental, com R$ 1.882. Os dados são de
2010 e consideram profissionais da rede pública e privada.
O Sindicato dos Professores
no Distrito Federal (Sinpro-DF) diz que o resto do país não serve de parâmetro.
É que, no DF, o governo federal banca despesas de Segurança Pública e parte dos
gastos com Educação e Saúde.
- Não podemos comparar o
salário do Distrito Federal com o de outros estados e sim com os dos demais
trabalhadores do DF. A grosso modo, todas as carreiras do DF têm salários
maiores: o médico ganha mais, o policial ganha mais - diz a diretora de Imprensa
do Sinpro, Rosilene Corrêa.
A greve terminou no último
dia 2. Para recuperar aulas, as Escolas funcionarão aos sábados até o fim do
ano.
O Professor de Português
Carlos Eugênio Rêgo, de 47 anos, recebe salário bruto de R$ 7.464,42 por mês.
Ele leciona há 21 anos e está perto do topo da carreira, cuja remuneração vai
de R$ 2.426,69 a R$ 8.794,44, conforme tabela do Sinpro. Trabalha no Centro de
Ensino Médio Setor Oeste, Escola da rede pública de Brasília com melhores
resultados no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) à exceção de colégios
militares. Ele diz que, ocasionalmente, dá aulas em cursinhos para complementar
a renda.
- O ponto fundamental é a
isonomia. Incomoda muito a enxurrada de reportagens dizendo que temos o maior
salário do Brasil. Tem que levar em conta o custo de vida - diz Carlos Eugênio.
Já o Professor de Física
Lucélio Oliveira Fernandes, 42 anos, conta que o Setor Oeste não tem
laboratório de Ciências e dispõe de apenas dois Docentes de Física para 1.140
Alunos de Ensino médio. Segundo ele, seria necessário pelo menos mais um
profissional.
- E olha que dizem que essa
é a melhor Escola do DF. Fico imaginando como é a pior - afirma Lucélio.
Às vésperas da
aposentadoria, o Professor de Geografia e Artes Francisco Chagas Rocha, o Paco,
de 64 anos, vê descaso na forma como os governos, depois de eleitos, tratam o
magistério:
- Se você ganha seis ou sete
mil reais por mês, acaba ganhando (líquido) 3.500 reais. E o GDF (governo do
Distrito Federal), escreva aí, por favor, o GDF, cretinamente, diz que o
Professor ganha bem - diz Paco.
Formados em Medicina têm
maior renda média
Engenharias também dão alto
retorno financeiro
No outro extremo das
carreiras universitárias, o Censo 2010 do IBGE mostra que nenhuma outra área é
tão vantajosa, em termos financeiros, quanto Medicina. Os médicos têm os
maiores salários e a menor taxa de desemprego entre profissionais com nível
superior: apenas 0,7%.
Engenharia Civil e
Construção é a segunda de melhor remuneração no país e a terceira com menor
taxa de desemprego (1,7%). Ao menos no que diz respeito ao desemprego, as
carreiras Docentes não são tão ruins, com taxas médias próximas a 3% (a média
nacional para todas era de 8% em 2010)
- O caso da Medicina chama
atenção. Taxa de desocupação baixa, renda média elevada e 42% dos profissionais
possuem dois empregos (ou mais), fixando-se em grandes centros urbanos. Há
déficit de profissionais para suprir a demanda nacional e elevada concentração
nos grandes e médios centros urbanos - diz Henrique Heidtmann, coordenador de
graduação da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV.
Para ele, este quadro
levanta um desafio importante de fixação de profissionais em regiões afastadas
dos centros urbanos, que precisam oferecer salários bem maiores que os dos
grandes centros e, mesmo assim, encontram dificuldades para contratar médicos.
Presidente da Federação
Nacional dos Médicos, Cid Carvalhaes ressalta que médicos trabalham, em média,
62 horas semanais, o que ajudaria a explicar a renda elevada, e reclama de
vínculos empregatícios precários e de falta de segurança e equipamentos:
- Não tem desemprego para
médico hoje. Tem subemprego. Para conseguir esse salário médio mensal, ele
cumpre jornada 50% maior que a de qualquer outro profissional e trabalha à
noite, aos sábados, domingos e feriados.
Na avaliação de Edson Nunes,
pró-reitor da Universidade Candido Mendes e ex-presidente do Conselho Nacional
de Educação, apesar de algumas carreiras terem renda e desemprego maiores que
outras, as taxas são sempre melhores que as da população sem diploma
universitário. Mas pondera que nem sempre o profissional de nível superior
consegue emprego em sua área. de formação.
Professor da FGV, Kaizô
Beltrão observa outro ponto importante:
- Existem atividades em que
há pessoas com diplomas de nível superior atuando em profissões que requerem só
nível médio ou outros níveis. São profissionais com diploma de nível superior
atuando em posições que não exigem graduação.
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